quinta-feira, 24 de novembro de 2016

JOIA É UM BEM SUPÉRFLUO?

     Muita gente provavelmente responderia à pergunta acima de modo afirmativo. Afinal, ninguém morre por não ter numa joia ou por perder uma joia que tinha. Mas, analisando o caso mais profundamente, vê-seque a resposta não é tão simples assim.
A criação de uma joia envolve, em termos bem resumidos, o trabalho do designer que a desenha no papel, do profissional que executa aquele projeto e por fim do joalheiro que vai vender a joia pronta.
Se ela inclui uma pedra preciosa, o que é normal, deve-se considerar o trabalho do garimpeiro que extraiu a pedra e as despesas que ele teve com equipamento e material de consumo. Se a gema foi produzida por uma empresa, há, além dessas despesas, também gastos com mão de obra, salários, impostos, taxas, etc.
Mas, a pedra preciosa não vai diretamente da mina ou garimpo para as mãos de quem cria ou produz a joia. Ela precisa ser lapidada. E, com o trabalho do lapidador, vêm também custos de material de consumo, equipamento, impostos, talvez aluguel, etc.
Além da lapidação, muitas gemas passam por processos de tratamento para melhorar ou modificar alguma propriedade física (geralmente a cor). E isso requer mais tecnologia, mão de obra, equipamento, material de consumo, impostos, etc.
O joalheiro que vai vender a joia pronta terá também suas despesas com impostos, salários dos vendedores, manutenção do espaço físico da loja, propaganda, etc. Se for um profissional consciente e realmente preocupado com a qualidade do produto que vende, talvez contrate um gemólogo para assegurar-se de que a pedra que está vendendo é realmente o que o fornecedor de gemas lhe disse ser.
Este gemólogo, por sua vez, não nasceu sabendo Gemologia; ele fez pelo menos um curso em alguma escola ou com algum gemólogo experiente.
Se eu fosse economista, provavelmente veria várias outras ramificações dessa cadeia produtiva, mas acho que isso é suficiente para mostrar o quanto de conhecimento, trabalho, material e outras despesas há por trás da beleza de uma joia. Ou seja, o quanto de renda e absorção de mão de obra ela proporciona.

Pense nisso quando olhar uma joia numa vitrine. Pense nisso quando o preço da joia lhe parecer muito alto. E pense nisso também quando ganhar uma joia de presente.

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

A GEOLOGIA E A ARQUEOLOGIA


Por diversas vezes, tanto em conversas pessoais quanto na mídia, vi pessoas confundirem Geologia com Arqueologia, atribuindo atividades de uma à outra. São áreas da ciência bem distintas, mas o fato de ambas lidarem com materiais antigos pode levar quem não as conhece a essa confusão.
Segundo a Wikipédia, a Arqueologia estuda as culturas e os modos de vida do passado a partir da análise de vestígios materiais. É uma ciência social que estuda as sociedades já extintas, desde o surgimento da espécie humana (transição do Australopitecos para o Homo habilis) até o presente. Alguns arqueólogos definem a Arqueologia como a reconstrução da vida dos povos antigos.
A Geologia estuda a  Terra, sua composição, estrutura, propriedades físicas, história e os processos que lhe dão forma. Ela não estuda sociedades, povos ou culturas.
Vê-se então que a Arqueologia trabalha com o ser humano, com as civilizações. A Geologia dedica-se às rochas, minerais e fósseis. Assim, a primeira trabalha com maternais que têm séculos ou milhares de anos de idade; a Geologia, com materiais que têm milhões ou bilhões de anos de idade (a Terra formou-se há 4,54 bilhões de anos).
A datação radiométrica desses materiais utiliza, por isso, métodos semelhantes, mas com elementos químicos diferentes. Enquanto a Arqueologia trabalha com um isótopo instável do carbono (o carbono 14), próprio para materiais de pouca idade (alguns milhares de anos), a Geologia usa isótopos instáveis de rubídio, potássio, samário ou, para as rochas mais antigas, de urânio, que permitem datar materiais com  milhões ou bilhões de anos.
Ambas se relacionam com outras ciências, como é natural. A Arqueologia se relaciona, por exemplo, com a História, Geografia e a Física. A Geologia tem ligações com a Química, Física e Biologia, mas principalmente com a Geografia e a Astronomia.
Um exemplo de interação entre Geologia e Arqueologia ocorreu no Rio Grande do Sul. O geólogo Carlos Henrique Nowatzki, da Unisinos, pesquisou e descobriu de onde foram extraídos os blocos de arenito usados na construção, pelos jesuítas, da igreja de São Miguel, no município de Santo Ângelo (RS), importante atração turística do estado. Eles têm hoje sua procedência bem estabelecida graças à Geologia.
A Geologia procura descobrir depósitos minerais de valor econômico (jazidas), para extração de minerais metálicos, material para a construção civil, pedras preciosas, metais nobres, etc. Procura também petróleo e recursos hídricos (Hidrogeologia). Já a Arqueologia busca materiais de valor histórico, museológico e cultural, não de valor comercial ou industrial. Uma exceção: houve uma época em que as múmias eram tão abundantes no Egito que foram vendidas toneladas delas aos Estados Unidos, para uso como combustível em locomotivas.
O Brasil conta hoje com quatorze cursos de graduação em Arqueologia, todos relativamente novos. A Geologia tem cursos de graduação mais numerosos, em torno de trinta.
Se uma obra civil, como abertura de túnel, barragem, estrada ou mesmo de uma mina revela a existência de um sítio arqueológico, ela deve ser paralisada até que o local seja estudado por arqueólogos. Só em casos excepcionais esses achados arqueológicos são suficientemente importantes para justificar a anulação de obras de grande porte, mas estudar, fotografar e amostrar o sitio arqueológico são coisas que podem e devem ser feitas antes que ele seja destruído pela obra civil em andamento. Um exemplo dramático disso é a cidade de Roma, cujo metrô tem uma extensão total relativamente pequena porque em qualquer local que se faça uma escavação não é difícil encontrar um sítio arqueológico.
A Arqueologia passou a ser vista com interesse e tornou-se uma ciência popular graças aos filmes de Indiana Jones, em que o herói, representado por Harrison Ford, é um professor de arqueologia. A Geologia tem forte apelo popular em filmes, livros e outras mídias que tratam de terremotos, vulcões, pedras preciosas, metais nobres e dinossauros, sendo estes os personagens principais do filme Parque Jurássico, por exemplo.
Em alguns aspectos, Geologia e Arqueologia se assemelham bastante. Ambas envolvem trabalhos de prospecção, escavação e análises do material recolhido. Não basta ao arqueólogo recolher um pedaço de cerâmica para conhecer a história local; é preciso ver de que tipo de objeto ele fazia parte e em que tipo de ambiente provavelmente era usado, entre outras coisas, para só depois mandar a amostra para datação. De modo semelhante, não basta ao geólogo coletar uma amostra de rocha e mandar fazer uma análise química, mineralógica ou geocronológica, para saber sua composição e idade. É preciso examinar todo o afloramento de onde ela foi extraída, ver sua estrutura, relação com outras rochas do local (se existirem), medir a direção e mergulho das camadas, veios, foliações ou fraturas, etc. 

Simplificando, então, podemos dizer que as duas ciências têm semelhanças, mas a Geologia trabalha com materiais muito mais antigos que a Arqueologia e nos quais não esteve envolvida ação humana.

domingo, 25 de setembro de 2016

MISTÉRIOS DO NOSSO UNIVERSO

             A Geologia oferece a nós, geólogos, fascinantes mistérios e desafios, e o universo, como era de se esperar, mostra-nos mistérios muito mais numerosos e mais misteriosos. Estes, porém, felizmente não cabe a nós decifrar; já temos suficientes interrogações à nossa volta. Como, porém, nossa amada Terra está imersa nesse universo, é bom saber um pouco sobre as dúvidas que fazem parte do trabalho de físicos, astrofísicos e astrônomos.
            Para mim, o primeiro e maior desses mistérios é a origem do universo. A teoria mais aceita é a do Big Bang, criada no final da década de 1920 pelo belga Georges Lemaître, um padre católico que era astrônomo, cosmólogo e físico. Ele a chamou de Hipótese do Átomo Primordial (o nome Big Bang foi dado por outro astrônomo, o britânico Fred Hoyle, em 1949).
            Segundo essa teoria, tudo o que chamamos de universo estava originalmente concentrado em um pequeníssimo ponto. Vocês conseguem imaginar isso? Eu não, mesmo que esse tudo fosse apenas energia e não matéria. Mas, a descoberta da chamada radiação cósmica de fundo, em 1964, veio dar grande suporte a essa teoria.
Houve então, entre 13,3 e 13,9 bilhões de anos atrás, uma súbita expansão (não explosão) daquele ponto inicial (o átomo primordial de Lemaître), dando início à formação do universo que conhecemos hoje. O que provocou essa súbita expansão? Não se sabe. Deus, talvez.
É preciso, porém, esclarecer que a teoria do Big Bang explica o início de tudo, mas não diz como se chegou àquela condição inicial. O que havia antes do Big Bang?  Dizem os cientistas que foi só com o inicio do universo que surgiu o tempo. Antes, não havia tempo, portanto não existiu um período antes do Big Bang.  Conseguem imaginar isso?  Eu também não.
No comecinho da grande expansão, havia apenas subpartículas atômicas (neutrinos, mésons, bósons e outras), viajando à velocidade da luz. Não havia ainda matéria. Foi o físico britânico Peter Higgs, em 1964, quem previu que deveria haver um bóson o qual, a partir de determinado instante, deu massa a outras subpartículas, como os quarks, ao entrar em contato com elas. A existência desse bóson foi comprovada, mas só muito recentemente, em 2012.
Aprendi, décadas atrás, que a velocidade da expansão do universo era decrescente, o que parecia óbvio: a grande expansão deveria estar perdendo força cada vez mais, e assim seguiria até tudo parar de se mover. Aí, pela ação gravitacional, os corpos celestes passariam a se atrair e se voltaria à condição inicial, quando ocorreu o Big Bang. Acontece, porém, que hoje se sabe que isso não é verdade. O que está havendo é uma velocidade de expansão cada vez maior!  Vocês conseguem entender nisso? Eu não. Mas não sou só eu: os cientistas também não sabem ainda por que isso acontece.
A explicação talvez esteja na chamada energia escura. Toda a matéria visível no universo conhecido (a soma de satélites, planetas, estrelas, seres vivos, etc.) mais a energia que se pode perceber representam apenas 4% da massa do universo! Ou seja, os outros 96%, a chamada matéria escura ou energia escura, a gente não vê e não percebe! Isso é ou não é, uma coisa assustadora?!  E não é preocupante que se busque em um mistério a explicação para outro?
A expansão cada vez mais rápida do universo visível era, para mim, uma coisa angustiante. Não tenho nenhuma culpa ou responsabilidade sobre isso, mas um universo em expansão cada vez mais acelerada não cabia na minha limitada compreensão e me deixava muito inquieto. Felizmente, fiquei sabendo, dias atrás, de uma teoria que me deixou mais tranquilo. Roger Penrose, importante físico da Universidade de Oxford, acha que o universo vai continuar se expandindo até que suas partículas percam massa. Surgirá então uma espécie de vácuo, em que o tempo irá parar e o universo morrerá, para se transformar em outro universo, por meio de novo Big Bang. Isso seria uma resposta à minha angustiante dúvida. Só que poucos cientistas acreditam nisso...
Falei aqui em universo que conhecemos e em universo visível. Pois saibam que os cientistas admitem também que existam outros universos além deste! A expansão a partir do Big Bang não teria sido uniforme; algumas porções do espaço teriam se expandido também, mas em outros momentos, diz Marcelo Gleiser, outro físico renomado. Haveria então outros universos, além do nosso, separados por espaços gigantescos, acrescenta ele.

            Isso tudo é mistério demais para este pobre geólogo. E olhem que eu nem falei nos possíveis habitantes desses outros mundos...

segunda-feira, 1 de agosto de 2016

A ESMERALDA E NÓS

As fraturas da esmeralda surgem durante sua formação. Por mais numerosas que sejam, não impedem que ela seja lapidada e, assim, brilhe com todo o seu esplendor.

       
Foto encontrada na internet,
sem autoria.

     A vida também nos causa fraturas, ferimentos. Mas, se soubermos conviver com isso, eles cicatrizarão e não impedirão que também sejamos lapidados e assim mostremos todo nosso brilho.

terça-feira, 12 de julho de 2016

MINERAIS RADIOATIVOS DENTRO DE CASA


            Em setembro de 1987, o Brasil foi palco do maior acidente com substâncias radioativas registrado no país e o maior do mundo fora de usinas nucleares. Em Goiânia (GO), uma clínica de radioterapia abandonou sem qualquer cuidado equipamento contendo césio 137, substância altamente radioativa. O equipamento foi recolhido por catadores de lixo reciclável para aproveitar o chumbo que continha. Com isso, o césio foi liberado e se espalhou pelo ambiente, levado pelos próprios catadores.
O homem que retirou o material o levou para a casa e o distribuiu a vizinhos e amigos porque achava muito interessante o modo como ele brilhava no escuro, com uma cor azul. Sua filha não só espalhou o césio 137 pelo corpo como chegou a ingeri-lo. Resultado: um mês depois quatro pessoas morreram em virtude da radiação. Outras mais viriam a morrer nos meses seguintes.
Em janeiro do ano seguinte, o jornalista Sérgio Danilo, talvez alertado pelo acidente de Goiânia, quis saber se uma amostra de material radioativo que tinha em casa havia dez anos podia ser perigosa. Ele tinha 44 anos de idade e 22 de jornalismo. Trabalhava na Gazeta Mercantil e era bem conhecido no meio geológico por ser o editor do setor mineral daquele jornal.
Submetido a exames, descobriu-se que Sérgio Danilo estava irremediavelmente contaminado pela radiação em quarenta diferentes partes do corpo, restando-lhe apenas dois anos de vida. Fora vítima do que ele próprio chamou de desinformação mineral.
Quando eu era estudante de Geologia, aprendi que no manuseio de minerais radioativos deve-se ter cuidado para não permitir que partículas dele fiquem retidas sob as unhas. O que não me ensinaram e fui aprender por iniciativa própria muitos anos depois é que o risco de contaminação depende da intensidade da radiação e do tempo em que o corpo fica a ela exposto. Também tive que ir atrás de informações sobre qual é a intensidade máxima de radiação suportada sem danos pelo corpo humano.
Por isso tudo, em outubro de 1988 decidi fazer uma varredura na minha coleção de minerais para ver se algum deles emitia radioatividade perigosa. Munido de um cintilômetro, aparelho que mede a radiação, aproximei-o do meu acervo mineral e descobri que dois minerais, uma columbita e uma autunita, faziam o aparelho disparar acelerados bips-bips. A columbita não me assustou muito, mas a autunita (fosfato hidratado de urânio e cálcio), sim. O aparelho mostrou que ela emitia radiação altíssima, em torno de 10.000 cps (choques por segundo).
Quando minha mulher soube do que eu descobrira, não quis saber de conversa: pediu que eu desse um fim à autunita imediatamente.
Eu sabia do risco que ele representava, mas não queria me desfazer de uma importante peça da coleção. Coloquei-a então numa lata de conserva e a levei para minha sala na empresa em que eu trabalhava.  A lata, eu sabia bem, não me protegia, mas era um recurso temporário até decidir o que fazer com a autunita.
Não demorei a me dar conta de que eu estava agora mais vulnerável que antes, pois passei a ficar várias horas por dia a menos de um metro de distância da fonte radioativa. Não era, pois uma solução inteligente.
O que fazer então? Eu não queria perder minha autunita nem mantê-la escondida, mas tampouco queria correr risco de ser contaminado por ela. Fiz então um teste: medi a radiação encostando o cintilômetro nela (o que dava os já citados 10.000 cps), e a seguir fiz várias outras medidas afastando o cintilômetro 10 cm cada vez. Vi então que a 10 cm da autunita a radiação já caía para metade. E a distâncias maiores as quedas na intensidade eram também aceleradas. 
Concluí, assim, que eu podia manter o mineral na minha coleção, mas sem ficar perto dele por muito tempo.

Se você tem minerais radioativos, é bom saber qual a intensidade da radiação que eles estão emitindo. E deixá-los pelo menos uns metros longe de você.

segunda-feira, 16 de maio de 2016

OS MINERAIS E A ÁGUA


Há  minerais que morrem de sede,  outros que morrem afogados e outros ainda que morrem afogados, renascem e voltam a morrer.  Vejam por quê.
      Muitas espécies minerais contêm água na composição química. Entre eles, destacam-se os minerais do grande grupo das zeólitas. São dezenas de minerais hidratados, que podem perder essa água, mas recuperá-la de novo sem maiores alterações. Isso, aliás, tem importantes implicações, tornando-os muito úteis na agricultura e em variados setores da indústria.
      Há, porém uma zeólita que tem comportamento diferenciado. Trata-se da laumontita. Esta quando se desidrata simplesmente se esboroa toda. Seus cristais prismáticos viram uma farinha e não há como reverter esse processo. Por isso, é difícil encontrar laumontita bem cristalizada. Ela pode ser assim vista em pedreiras e minas, mas só onde há material recém-desmontado.
      Menos frágil, mas muito mais nobre que a laumontita é a opala, uma pedra preciosa. Ela também contém água e, se for mantida em ambientes de temperatura elevadas, pode perdê-la e se quebrar.
Mas, se há minerais que morrem por falta d’água, há também os que  morrem  por excesso dela.  Halita, carnallita e silvita, por exemplo. São minerais higroscópicos e, se deixados em atmosfera úmida, vão se dissolvendo, até virar um líquido. Halita é o nome mineralógico do sal que usamos nos alimentos, e quem cozinha sabe que ele se dissolve em ambiente húmido.
Por fim, há minerais que são sazonais, como certas frutas: formam-se no verão, desaparecem no inverno ou na estação chuvosa, voltando a se formar no verão seguinte.
A sinjarita ocorre no leito seco de um rio intermitente de Sinjar, no Iraque (daí o nome). Ela forma-se em sedimentos recentes por evaporação lenta de água subterrânea saturada em Ca2+ e Cl-. Mas, como é altamente higroscópica, pode desaparecer na estação chuvosa, reaparecendo na estação seca seguinte.
A hidrocloroborita foi descoberta na China e descrita em 1965. Em 1966, foi divulgada uma segunda ocorrência na localidade de Salar Carcote, em Antofagasta (Chile), onde os cristais foram encontrados em uma camada contínua e irregular com cerca de 15 cm de espessura. Os autores que a estudaram, ao procurarem novamente o mineral em outra ocasião, mas na mesma localidade, não o acharam. Verificaram então que o nível freático (nível da água subterrânea) estava alguns decímetros apenas abaixo da camada que continha o mineral, em cota superior à da época em que o mesmo havia sido descrito inicialmente. Com isso, concluíram que a hidrocloroborita é um mineral sazonal, que se dissolve nas estações úmidas, voltando a cristalizar em estações secas.
A antarticita, descoberta em Terra de Vitória, na Antártica, constitui uma forma mais hidratada de sinjarita, que funde a 30 oC e, por isso, é destruída nas estações secas, se a temperatura atingir aquele valor. Formas menos hidratadas que a antarticita e mais hidratadas que a sinjarita foram obtidas sinteticamente, mas ainda não foram encontradas na natureza.

Outro interessante mineral sazonal é a acetamida, uma amida cristalina derivada do ácido acético Ela foi descoberta em rejeitos de uma mina de carvão da antiga União Soviética, onde se forma durante estações secas em áreas enriquecidas em amônia e isoladas do contato com oxigênio e luz solar. Se exposta ao sol, o mineral volatiliza-se em apenas algumas horas.

segunda-feira, 21 de março de 2016

CLASSIFICAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS GEMOLÓGICAS

          As pedras preciosas compreendem um grande e diversificado grupo de minerais, com mais de cem tipos diferentes apenas no Brasil. Elas fazem parte de um grupo maior, o das gemas, onde são as mais importantes e a grande maioria (quase 90%).  O grupo das gemas, por sua vez, pertence a um grupo ainda maior, que inclui também os metais preciosos e as pedras ornamentais, e que são as substâncias gemológicas.  
           O amplo universo dessas substâncias gemológicas, resumido na tabela vista no final, é, portanto, muito variado, o que contribui para que denominações inadequadas sejam frequentemente usadas.
Sua diversidade está não apenas na origem e composição dessas substâncias, mas também no seu uso.
         Antes de mostrar esses muitos tipos, convém estabelecer o que é uma substância gemológica: é uma substância geralmente natural e inorgânica, utilizada para adorno pessoal ou com fins decorativos.  Poder-se-ia usar como sinônimo material gemológico, mas é preferível não fazê-lo porque alguns autores incluem sob essa denominação apenas os minerais usados para adorno pessoal.
            Quanto à origem, as substâncias gemológicas podem ser divididas em três grupos, já citados:

a)      Gemas (as mais numerosas e mais importantes).
b)      Metais nobres.
c)      Pedras ornamentais.

Gemas
Gema é uma substância gemológica geralmente natural e inorgânica que, por sua raridade, beleza e durabilidade, é usada como adorno pessoal. Minerais de grande beleza, mas que não suportam lapidação ou montagem para uso como adorno pessoal são minerais para coleção, minerais de valor museológico, mas não gemas.
Normalmente a gema é submetida a um processo chamado lapidação, a fim de obter a forma que mais ressalte sua beleza, bem como o máximo de brilho. Assim, uma gema pode ser bruta (no estado natural) ou lapidada. Alguns autores, porém, só consideram gema aquela que sofreu lapidação.
Como foi dito atrás, as gemas são as substâncias gemológicas mais importantes e mais numerosas. Dentre as naturais, 87% aproximadamente são minerais; cerca de 10% são gemas orgânicas e 3% são rochas.
Além das gemas naturais, isto é, aquelas encontradas na natureza e que são divididas em minerais e orgânicas, há mais sete tipos, as gemas artificiais, sintéticas, reconstituídas, tratadas, realçadas, revestidas e compostas.
A pérola cultivada é uma gema orgânica, mas constitui categoria à parte, pois não se enquadra nem na categoria natural nem sintética. Ela é produzida por um processo natural, mas que foi induzido por ação humana.
Gema sintética é aquela produzida em laboratório, mas que existe também na natureza.
Gema artificial é aquela produzida em laboratório, mas sem similar conhecido na natureza.
Gema reconstituída é aquela também produzida em laboratório, por meio da aglomeração ou fusão parcial de fragmentos muito pequenos de uma gema natural.
Gema tratada é o nome dado à gema em que a cor ou outra propriedade foi modificada para lhe dar mais valor. Com relação à cor, o tratamento pode ser para melhorar a cor natural, obter outra cor ou colorir gemas incolores.
Gema realçada é a que teve uma de suas propriedades (geralmente a cor) melhorada artificialmente.
Gema revestida é a denominação dada à gema lapidada sobre cuja superfície se fez depositar uma fina camada, colorida ou não, da mesma substância ou de outro material.  O processo é usado, por exemplo, para esmeraldas.
Chama-se de gema composta aquela formada por duas ou mais partes unidas por cimento ou qualquer outro método artificial. Os componentes podem ser substâncias inorgânicas naturais, sintéticas, ou produtos químicos artificiais. Assim pode-se ter gema sobre gema, gema sobre vidro, gema sobre gema com vidro intercalado, etc.

Metais nobres
Metais nobres é denominação quem se dá ao ouro, à prata e alguns dos metais do grupo da platina (platina, ródio e paládio). São usados como adorno pessoal, sozinhos ou com gemas.
O ouro usado em joias não é ouro puro, mas sim uma liga com 75% ou menos de ouro e 25% ou mais de outros metais (prata, cobre, ferro entre outros), dependendo da cor desejada. 
O ródio normalmente é usado apenas para revestir outro metal.

Pedras ornamentais
As pedras ornamentais são rochas - menos frequentemente minerais - usadas para decoração de interiores ou acabamentos arquitetônicos. Dividem-se em minerais decorativos e rochas ornamentais.
Os minerais decorativos são aqueles utilizados para decoração de interiores (como vasos, cinzeiros, mesas, pesos de papel, estatuetas e incontáveis outras aplicações). Alguns deles são usados também como gema, ou seja, para adorno pessoal. Ex.: sodalita, quartzo rosa, prata, malaquita, lápis-lazúli e ágata.
As rochas ornamentais são representadas principalmente pelos mármores e granitos. O que se chama de granito no comércio e na indústria desses materiais pode ser realmente granito, mas muitas vezes são outras rochas silicáticas, como granodiorito, riolito, tonalito, sienito, etc. Do mesmo modo, o termo mármore pode designar, nesses setores, também calcário, mármore dolomítico e dolomito, todas elas rochas carbonáticas.
Rochas ornamentais são usadas em acabamentos arquitetônicos, cortadas em lajotas, frisos e blocos, regulares ou não, para pisos, colunas, paredes, escadarias, monumentos, etc. como revestimento ou não.
Muitos geólogos talvez não aprovem a denominação pedra ornamental, mas, como ela inclui tanto minerais quanto rochas, é válido chamar assim.  Além disso, em Gemologia o uso da palavra pedra é muito comum.
Como se pode ver, nessa ampla classificação das substâncias gemológicas não aparece nenhuma vez a denominação pedra semipreciosa. A distinção pedra preciosa / semipreciosa é confusa, arbitrária e sem fundamento cientifico ou econômico. Como já está consagrada a denominação pedra preciosa, admite-se seu emprego para designar as gemas em geral, com exceção da pérola cultivada e das gemas orgânicas. Mas, pedra semipreciosa é denominação a abandonar, o que, aliás, já aconteceu na maioria dos países.

CLASSIFICAÇÃO DAS SUBSTÂNCIAS GEMOLÓGICAS


SUBSTÂNCIA

USO
EXEMPLOS TÍPICOS
Gemas
Gemas Naturais
Minerais
Adorno


pessoal
Esmeralda, diamante, tumalinas, granadas, safira, ametista, rubi, etc.
Orgânicas
Coral, âmbar, pérola,
marfim, etc.

Pérolas Cultivadas
Pérolas Biwa, Mabe,
South Sea,  e Taiti,
Gemas Sintéticas
Esmeralda sintética, rubi sintético, diamante sintético, etc.
Gemas Artificiais
Zircônia cúbica, YAG, GGG, fabulita..
Gemas Reconstituídas
Turquesa reconstituída, lápis-lazúli reconstituído, âmbar reconstituído.
Gemas Tratadas
Topázio irradiado, citrino obtido por tratamento de ametista, etc.
Gemas Realçadas
Esmeralda tratada com óleos

Gemas Revestidas

Esmeralda revestida
Gemas Compostas
Gema + gema, gema + vidro, etc.

Metais nobres

Ouro
Ouro 18 K (Ouro 750 ), Ouro 14 K
Prata
Prata 950 (Prata 95), 
Prata 900 (Prata 90)
Grupo da platina
Platina, paládio e ródio.
Pedras ornamentais
Minerais
Decorativos
Decoração
de interiores
Ágata, sodalita, quartzo rosa, prata, malaquita, alabastro, etc.
Rochas ornamentais
Acabamentos arquitetônicos

Mármores, granitos, ardósias, quartzitos, etc.

 

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

É OURO OU NÃO É ?



Nunca acreditei que o material mostrado na foto e vendido como ouro, nessas garrafinhas com um líquido incolor, fosse mesmo ouro. Este metal tem uma densidade enorme e não flutuaria como se vê, no líquido do vidrinho. 


Flutuar não é bem o termo, porque ele não fica na superfície do líquido; quando agitado, espalha-se nele e só aos poucos vai para o fundo.
O líquido é, claro, pode não ser água, mas mesmo que seja uma substância de densidade bem alta, como é o bromofórmio, acho difícil que o ouro não fique sempre no fundo.
Em janeiro, porém, vi esse material à venda na Smithsonian Institution, em Washington, como ouro, por 8 dólares. Não só dizem que é ouro como dão gratuitamente um cartãozinho descrevendo a história e usos do precioso metal. 
A Smithsonian é muito séria. Daí minha dúvida: será este ouro na verdade uma liga, com ouro, sim, mas em pequena proporção? O líquido não é água, me informaram lá.
            Resolvi expor minha dúvida em vários grupos do Facebook que reúnem colecionadores de minerais. Os comentários postados mostram que a dúvida não é só minha, mas de muita gente.
            Alessandra Silva contou que já teve um vidrinho assim, mas jogou fora, certamente por achar que não tinha valor.  William Campos disse: “Qualquer idiota sabe que não é ouro, mas não informou de onde vem sua convicção.”
Sergio Klein foi mais lúcido e ponderado na sua opinião: “acho que o líquido é glicerina, que é viscosa, e assim os flocos levam mais tempo para se deslocarem. Existem vidros com prata e com cobre, do mesmo jeito. Viscosidade e densidade são coisas bem diferentes, e as pessoas costumam confundir. Creio que o líquido viscoso seja glicerina.”
            Klein traz duas informações importantes: o líquido talvez não seja muito denso, mas sim muito viscoso, o que não me havia ocorrido. E conta que são vendidos vidrinhos também com cobre ou prata, que eu nunca vi.
            Meu amigo gemólogo Rogério Viana Leite conta que no Museu de Gemas que havia no mezanino da Torre de TV em Brasília, onde ele trabalhou, eram vendidos esses vidros com folhas de ouro. Eles inclusive forneciam um certificado de autenticidade. Mas, conta que ele ainda possui dois vidros desses e que em um deles as folhas oxidaram completamente e no outro houve oxidação parcial. E ambos os vidros perderam os líquidos.
            Isso confirma minha suspeita de que se trata de uma liga de ouro, mas com porcentagem muito baixa desse metal, daí a oxidação. E uma pessoa ligada aos distribuidores disse ao Rogério que se trata, sim, de uma liga de ouro de baixa qualidade.
            Rogério informa também que o líquido pode evaporar, informação importante para quem adquire o produto.
            Julio Cesar Bortoluzzi também vende os potes com ouro, no seu museu A Mina, em Gramado (RS). Eles dizem sempre aos clientes que se trata de metal com banho de ouro, banho este que deve ser bem leve até pelo preço de venda dos potes. Julio Cesar postou também que vai entrar em contato com o fabricante, que é de Minas Gerais, para saber a natureza do líquido e para confirmar a qualidade do banho de ouro. E informou que hoje a China produz muito esse produto.
Bortoluzzi chama atenção para o fato de que banho de ouro é uma técnica muito barata.  Um banho tipo flash ou eletroplate, diz ele, levaria essas folhas a custar em torno de R$ 1,00. “Mesmo um banho com 5 milésimos de ouro, que é o banho de bijuterias baratas, seria em torno de R$ 2,00 Então um pote desses com folhas banhadas a ouro é barato mesmo. Pode se importar da China por menos de 1 dólar”, escreveu ele.
            Gabriel Gonçalves não duvida que as folhas sejam banhadas, mas como o ouro é altamente maleável, “talvez a massa total de ouro necessária para fazer as folhas dentro de um potinho seja tão pequena que até valha a pena usar ouro mesmo”, diz ele. Gabriel calcula que um potinho com folhas de 10 micrômetros de espessura e 5 cm² contém aproximadamente 0,1 g de ouro. Como o grama deste metal custa hoje aproximadamente R$ 150,00, cada pote custaria algo em torno de R$ 15,00, logo, pode ser ouro mesmo e não apenas um banho. E acrescenta: “Não sei como isso é fabricado, mas o fato de ele ‘flutuar’ na verdade tem mais a ver com a resistência do fluido causada pela grande área da folha em relação a sua massa. Da mesma forma que uma folha de papel demora mais para ‘afundar’ no ar do que uma bola de boliche, a relação entre a massa da folha, sua área superficial, a densidade e principalmente a viscosidade do líquido fazem com que ela afunde mais devagar.”
            Mauricio Fenilli lembra que “se o líquido for um óleo com alto índice de refração, as folhas parecerão ainda maiores e mais espessas do que realmente são”.
            O geólogo José Eduardo Amaral conta que, no Japão, viu “vodca de batata, também chamada de saquê de batata, com finíssimas folhas de ouro em suspensão. E são folhas de ouro, sim. Quando em repouso, aos poucos vão para o fundo da garrafa, lentamente.  A relação área/massa das folhas de ouro é favorável a isso. “ Confirma, pois, o que pensa Gabriel Gonçalves.  Alex Ribeiro conta que leu sobre “uma cerveja belga, Golden Queen Bee, em que flocos de ouro flutuam no interior. E indica um vídeo sobre isso: www.youtube.com/watch?v=f044levfMQw “.
            Outro comentário foi feito por Van Van e reforça as explicações de Amaral e Gabriel Gonçalves. “El oro es tan maleable que puede trabajarse mediantes golpes para dejar uma lámina tan fina que su espessor llega a unas pocas micras. El oro cuando se encontra em tan  finas láminas pude flotar em agua, aunque ele liquido que acompanha al oro em estes frascos suele ser alcohol que evita que essas delgadas láminas se pegoteen.”
             O geólogo Rodrigo Dal Olmo Sato também acredita que é ouro mesmo. “Tenho essas folhas de ouro, são folhas de ouro utilizadas em restauros de esculturas e molduras douradas. São compradas em lojas especializadas. É ouro, sim.”     

Há, porém, quem acredite que não há nada de ouro realmente. Katherine De Paula acha que “provavelmente é alumínio pintado com tinta dourada impermeável para não enferrujar” e Cleomar Piovesan tem certeza de que são “pequenas lâminas de alumínio dourado com uma mistura de álcool e vaselina vendida como lenda do ouro”.
Então, como ficamos?
Para mim trata-se de ouro, mas na forma de liga ou talvez, revestimento.  O fato de poder oxidar-se completamente assegura que não é ouro puro.
Estaria a Smithsonian Institution, neste caso, enganando os consumidores ?  Não.  Todos nós falamos em anel de ouro, brinco de ouro, pulseira de ouro, etc. mesmo sendo eles feitos com uma liga que tem no máximo 75% de ouro.  Poderia ser mais transparente, isso sim, informando, em letras miúdas a real natureza do material. Aliás, a Smithsonian deveria fazer isso também com as cianitas que vende na loja do museu. Elas têm um brilho e cores muito atraentes, mas que são frutos de um tratamento que as reveste com um óxido metálico.
E com relação ao líquido?  Pelos depoimentos de Sérgio Klein  e Cleomar Piovesan,  acredito que seja glicerina, talvez com álcool também. Álcool apenas não deve ser, pois não tem a mobilidade que seria de se esperar dessa substância.
Mas, continua aguardando notícias de Julio Cesar Bortoluzzi, que vai pedir informações ao seu fornecedor.