terça-feira, 12 de julho de 2016

MINERAIS RADIOATIVOS DENTRO DE CASA


            Em setembro de 1987, o Brasil foi palco do maior acidente com substâncias radioativas registrado no país e o maior do mundo fora de usinas nucleares. Em Goiânia (GO), uma clínica de radioterapia abandonou sem qualquer cuidado equipamento contendo césio 137, substância altamente radioativa. O equipamento foi recolhido por catadores de lixo reciclável para aproveitar o chumbo que continha. Com isso, o césio foi liberado e se espalhou pelo ambiente, levado pelos próprios catadores.
O homem que retirou o material o levou para a casa e o distribuiu a vizinhos e amigos porque achava muito interessante o modo como ele brilhava no escuro, com uma cor azul. Sua filha não só espalhou o césio 137 pelo corpo como chegou a ingeri-lo. Resultado: um mês depois quatro pessoas morreram em virtude da radiação. Outras mais viriam a morrer nos meses seguintes.
Em janeiro do ano seguinte, o jornalista Sérgio Danilo, talvez alertado pelo acidente de Goiânia, quis saber se uma amostra de material radioativo que tinha em casa havia dez anos podia ser perigosa. Ele tinha 44 anos de idade e 22 de jornalismo. Trabalhava na Gazeta Mercantil e era bem conhecido no meio geológico por ser o editor do setor mineral daquele jornal.
Submetido a exames, descobriu-se que Sérgio Danilo estava irremediavelmente contaminado pela radiação em quarenta diferentes partes do corpo, restando-lhe apenas dois anos de vida. Fora vítima do que ele próprio chamou de desinformação mineral.
Quando eu era estudante de Geologia, aprendi que no manuseio de minerais radioativos deve-se ter cuidado para não permitir que partículas dele fiquem retidas sob as unhas. O que não me ensinaram e fui aprender por iniciativa própria muitos anos depois é que o risco de contaminação depende da intensidade da radiação e do tempo em que o corpo fica a ela exposto. Também tive que ir atrás de informações sobre qual é a intensidade máxima de radiação suportada sem danos pelo corpo humano.
Por isso tudo, em outubro de 1988 decidi fazer uma varredura na minha coleção de minerais para ver se algum deles emitia radioatividade perigosa. Munido de um cintilômetro, aparelho que mede a radiação, aproximei-o do meu acervo mineral e descobri que dois minerais, uma columbita e uma autunita, faziam o aparelho disparar acelerados bips-bips. A columbita não me assustou muito, mas a autunita (fosfato hidratado de urânio e cálcio), sim. O aparelho mostrou que ela emitia radiação altíssima, em torno de 10.000 cps (choques por segundo).
Quando minha mulher soube do que eu descobrira, não quis saber de conversa: pediu que eu desse um fim à autunita imediatamente.
Eu sabia do risco que ele representava, mas não queria me desfazer de uma importante peça da coleção. Coloquei-a então numa lata de conserva e a levei para minha sala na empresa em que eu trabalhava.  A lata, eu sabia bem, não me protegia, mas era um recurso temporário até decidir o que fazer com a autunita.
Não demorei a me dar conta de que eu estava agora mais vulnerável que antes, pois passei a ficar várias horas por dia a menos de um metro de distância da fonte radioativa. Não era, pois uma solução inteligente.
O que fazer então? Eu não queria perder minha autunita nem mantê-la escondida, mas tampouco queria correr risco de ser contaminado por ela. Fiz então um teste: medi a radiação encostando o cintilômetro nela (o que dava os já citados 10.000 cps), e a seguir fiz várias outras medidas afastando o cintilômetro 10 cm cada vez. Vi então que a 10 cm da autunita a radiação já caía para metade. E a distâncias maiores as quedas na intensidade eram também aceleradas. 
Concluí, assim, que eu podia manter o mineral na minha coleção, mas sem ficar perto dele por muito tempo.

Se você tem minerais radioativos, é bom saber qual a intensidade da radiação que eles estão emitindo. E deixá-los pelo menos uns metros longe de você.