Em um dos logradouros públicos mais frequentados de Porto Alegre, o Parque Farroupilha, há uma atração geológica que pouquíssima gente vê. E não vê porque a administração municipal insiste em não mostrar. Trata-se de um belo tronco de árvore fossilizado que está exposto junto ao lago (foto abaixo), perto do Café. Ele fica junto também a um dos principais caminhos do parque.
Como a estrutura e a textura da madeira estão bem
preservadas, apesar de a peça ter 200 milhões de anos de idade, e como não há
nada que identifique o fóssil, quem passa pensa que se trata de um tronco
atual, resto de uma árvore que morreu ali mesmo.
A algumas dezenas de metros do local, outro fragmento de
tronco fóssil, bem menor, igualmente sem identificação. jaz semiencoberto pela
vegetação, bem em frente à sede da administração do parque.
Inconformado
com o descaso com que vinham sendo tratados os dois fósseis, em 22 de maio de
2003 sugeri a Marcelo Barbosa, jornalista da Zero Hora, que fizesse uma
reportagem sobre o assunto. Ele ficou interessado, disse que faria a matéria,
entrevistou-me no dia 6 de junho, mas nada foi publicado. Procurei,
tempos depois, outro grande jornal da capital, mas também ignoraram minha
sugestão de pauta. Dia 16 de março de 2007, escrevi a Marcela Donini, também da Zero Hora, sugerindo reportagem sobre os troncos fósseis no caderno Bom Fim, mas não tive nenhum retorno., Mais tarde, falei sobre isso com um vereador; não sei se ele
tomou alguma iniciativa, mas o fato é que os troncos continuaram lá do mesmo
jeito, solenemente ignorados.
Lá
por 2004, quando eu era coordenador do Museu de Geologia da CPRM, recebemos
convite da Prefeitura para participar das atividades da Semana de Ciência e
Tecnologia. É um evento anual que, em Porto Alegre, era coordenado por ela,
tendo à frente a Secretaria Municipal da Indústria e Comércio (Smic). Aceitamos
o convite e participamos de diversas reuniões preparatórias, na primeira das
quais a Smic pediu sugestões de atividades a serem desenvolvidas durante o
evento. Falei então sobre os troncos sem identificação e propus uma parceria: o
Museu de Geologia criaria uma placa de identificação para as duas peças, ou
pelo menos para a maior delas, com o nome do fóssil, idade e outras
informações, e a Prefeitura se encarregaria de mandar confeccioná-la. Na Semana
de Ciência e Tecnologia, se faria a sua instalação, com a presença de
representantes da CPRM e da administração municipal.
Nessa
época, o tronco menor estava jogado no chão, em meio a outros fragmentos de
rocha, como uma pedra qualquer, o que me levava a crer que nem mesmo a
Prefeitura sabia que se tratava de fósseis. Narrei aos presentes as minhas
fracassadas tentativas de divulgar aquela atração geológica e o representante
da Smic me disse que eu devia era procurar a administração do Parque
Farroupilha, não a imprensa ou vereadores. Deu-me o nome do engenheiro
responsável pelo Parque Farroupilha e fui falar com ele, levando em mãos ofício
formalizando a proposta de parceria.
O engenheiro não estava no seu escritório (que fica
no próprio parque), mas expus o assunto à funcionária que me atendeu. Como eu
esperava, ela ficou muito surpresa e quis saber onde estavam os tais troncos
fósseis. Mostrei o menor, que jazia abandonado bem em frente ao escritório em
que nos encontrávamos. O outro ela não quis ir ver, embora estivesse perto
dali.
O administrador do parque nunca enviou resposta à
nossa proposta. Só o que fizeram foi ajeitar melhor o tronco menor, hoje
isolado das rochas comuns, embora ainda escondido pela vegetação.
Por que a Prefeitura se recusa a identificar os dois
troncos fósseis, duas atrações tão interessantes do Parque Farroupilha ? Não
sei responder. A única explicação que encontro é o temor que curiosos comecem a
tirar pedaços deles. Se for esse o motivo, acho que deveriam se preocupar
menos. Em primeiro lugar porque não é nada fácil quebrar um tronco de sílica
maciça. Em segundo porque martelar aquilo vai fazer um barulho facilmente
ouvido na sede da administração do parque. Terceiro porque troncos fósseis
exatamente como aqueles, mas muito maiores, que existem no acostamento da
estrada federal que liga Mata a São Pedro do Sul, no centro do estado, estão há
anos expostos ali, junto ao asfalto, inclusive com uma placa que convida os
viajantes a visitá-los, e nunca foram depredados, nem mesmo pichados.
Mas, vamos supor que
alguém de fato pegue uma marreta e tire algumas lascas do tronco maior,
danificando-o seriamente. Tenho certeza que o Museu Guido Borgomanero, de Mata,
há de fornecer outro para substituí-lo. Eles doaram uma peça bem maior ao Museu
de Geologia e várias outras menores ao Museu Geológico e Cartográfico de
Osório. E madeira fóssil é o que não falta naquela região do Estado.
O que falta, sim, é bom
senso e disposição à Secretaria Municipal do meio Ambiente, responsável pelo
parque, para dar
aos fósseis que ali estão o destaque que merecem.