terça-feira, 27 de outubro de 2020

OS FANTÁSTICOS BASALTOS COLUNARES

 

     Já mostrei, neste blog, belas imagens de ametistas e ágatas extraídas de basaltos, principalmente do Rio Grande do Sul. Mostrei também os curiosos, belos e delicados dendritos, depósitos de óxido de manganês formados nos mesmos basaltos. Mas, em alguns lugares é o próprio basalto (às vezes, uma rocha semelhante) que nos encanta com uma feição surpreendente, a disjunção colunar.

A lava de composição basáltica ao se resfriar solidifica, formando o basalto. Nesse processo, podem surgir fraturas horizontais paralelas, que permitem obter lajotas, muito usadas, por exemplo, para pisos e calçadas no sul do Brasil e produzidas em grande escala em municípios como Paraí e Nova Prata (RS). Em certos locais, porém, formaram-se não placas horizontais, mas incríveis colunas verticais, limitadas por faces planas, muitas delas com seção hexagonal quase perfeita. É o que os geólogos chamam de disjunção colunar.

Muitos anos atrás, eu li um artigo que descrevia em detalhe o processo de fraturamento que resulta nessas colunas. A explicação não era simples e confesso que não tive paciência para me deter muito nela.

Um estudo muito mais recente, publicado em 2018(*), mostrou que é quando a lava solidifica em temperaturas entre 90 e 140 oC abaixo da temperatura normal de formação do basalto (980 oC) que surgem as tais colunas.  O estudo foi feito por cientistas da Universidade de Liverpool (Inglaterra), em basaltos do vulcão Eyjafjallajökull, da Islândia. 

As colunas podem ter até 30 metros de altura pelo menos e largura que vai de poucos centímetros a até 3 metros.  Costumam ter cinco ou seis faces, mas algumas chegam a sete, e outras não passam de três.

Muitas vezes, talvez na maioria delas, a rocha é, a rigor, diabásio não basalto.  Os dois têm a mesma composição, com a diferença de que o diabásio é uma rocha subvulcânica, pois se forma por resfriamento do magma dentro da crosta, a uma profundidade relativamente pequena enquanto o basalto é vulcânico (forma-se, como foi dito, por resfriamento na superfície). Como o basalto é muito mais abundante, é normal o diabásio ser chamado também de basalto quando não se exige muito rigor científico, como aqui.

  Alguns afloramentos com estrutura colunar são mundialmente famosos. Um deles (foto abaixo) é a Torre do Diabo (Devils Tower), no estado de Wyoming (EUA), cenário do filme Contatos Imediatos de Terceiro Grau. Só que este é formado por uma rocha vulcânica diferente, o fonolito, que se formou, neste caso, invadindo rochas sedimentares (hoje completamente erodidas).

  

 Outro afloramento conhecido mundialmente é a Calçada dos Gigantes (Giant’s Causeway), em Antrim, na Irlanda do Norte, onde foram contadas 40.000 colunas de basalto!

    Devils Postpile, na Califórnia, é mais um afloramento mundialmente conhecido. Nele, é notável a presença de colunas encurvadas em alguns pontos.

 


                No topo do afloramento, algumas colunas mostram claramente o formato hexagonal da seção transversal, como se vê na foto abaixo. 

 


 A Islândia possui também belíssimos afloramentos desse tipo, mostrados alguns nas cinco fotos seguintes. O afloramento da terceira foto pode não ser tão bonito como os outros, mas é muito interessante por associar a formação de colunas com intenso faturamento horizontal. 

 






                Outro local que eu tenho muita vontade de conhecer é a ilha de Staffa, na Escócia que mostra as belas colunas vulcânicas das três fotos abaixo. 

 




               Fotos como essas me deixavam (e deixam) sempre com uma vontade enorme de ver ao vivo esses lugares.

Em 2013, eu estava dando um curso de Gemologia em Tamanrasset, na Argélia (bem no meio do deserto do Saara) e vi, na Casa do Artesanato, um cartaz mostrando um belo morro da região, o monte Hoggar. Eu já vira fotos do Hoggar em vários outros locais, pois ele é muito bonito.  Um dia, porém, ao passar pelo cartaz citado, tive a impressão de que se tratava de um morro de basalto colunar.  Olhei com mais cuidado, e a impressão ficou muito reforçada.

Em um passeio pelo deserto da região que me proporcionaram dias depois, pedi que me levassem lá e – aleluia! - era um belo afloramento de basalto colunar, o maior que eu vira até então. Não fotografei porque lá tudo é (ou era) proibido fotografar.  Mas aí vai uma bela foto da Wikipédia.



Belos afloramentos desse tipo de rocha podem ser vistos igualmente em Portugal (abaixo) e nas ilhas Canárias.



O afloramento seguinte é espetacular, mas lamento não saber informar onde se situa. 

 

               O Brasil tem uma imensa extensão de seu território coberta por basaltos. Vai do Rio Grande do Sul a São Paulo, estendendo-se pelo Uruguai, Paraguai e Argentina.  Apesar dessa grande área basáltica, não conheço nenhum afloramento espetacular como os mostrados até aqui.  Em vários locais, porém, existem afloramentos similares, apenas pequenos e com colunas não tão bem formadas. 

              O melhor que eu vi foi ao norte da cidade de Vacaria, na BR-116, perto de um posto da Polícia Rodoviária Federal. A rocha forma ali colunas poliédricas de três ou quatro faces, e quando estive no local, há mais de vinte anos, eram extraídas peças de até 1 m de comprimento por até 8 cm de largura aproximadamente.  Esse tipo de rocha é usado para revestimento de paredes, sendo comercializado com o nome de basalto palito. Meu colega geólogo Álvaro Santos informou-me que aquele raro afloramento era usado também para obtenção de moirões, empregados nas propriedades rurais da região.  Isso mostra que peças maiores que as que eu vi eram ali extraídas.


Esse afloramento mereceu breve descrição de Josué Camargo Mendes, no seu ótimo livro Conheça o Solo Brasileiro, onde obtive a foto acima.

              Outro município em que encontrei basalto prismático foi num corte de estrada em Nova Bréscia, também no Rio Grande do Sul.

              Meu colega Sérgio Freitas Borges informa que há basalto desse tipo entre Lages e São Joaquim, em Santa Catarina.

              Outro colega, Antônio Pedro Viero, relata a existência de uma pedreira em atividade nesse tipo de rocha em Santo Antonio da Patrulha (RS). É um afloramento que ele considera sensacional e aonde leva sempre seus alunos da Petrologia Ígnea para atividade de campo. Fica um pouco antes do pedágio de Santo Antonio da Patrulha, na BR-290 (Free Way) indo no sentido de Osório. Se não me falha a memória - informa ele - fica no km 25 da Free Way, a esquerda de quem vai para a praia. É uma pedreira de brita da Sultepa. Dá para vê-la da rodovia.

Como geólogo, lamento muito a destruição desses belos afloramentos para fins industriais. O geólogo Prof. Luiz Fernando Scheibe, sente o mesmo. Certamente movido por esse sentimento, ele comprou algumas colunas do tal basalto palito numa loja de pedras para revestimento e montou esta escultura na sacada da sua casa, à qual deu o nome de “Ode ao Diabásio”.


Para encerrar, mais um maravilhoso basalto colunar, este da República Checa.  Não sei se é efeito do ângulo da foto, mas esta imponente “catedral” de basalto me encanta como poucos afloramento desse tipo conseguem encantar. 

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(*)http://www.geologyin.com/2018/04/new-insight-into-how-giants-causeway.html #l4b0M9UwbMrZiW8l.99

 

Créditos:

-  Várias das fontes onde obtive as fotos aqui apresentadas foram citadas no texto, mas outras não sei informar, porque as fotos foram obtidas no Facebook ou na Wikipédia sem essa informação.

- Dados sobre disjunção colunar em geral podem ser obtidos em http://volcano.oregonstate.edu/columnar-jointing.

segunda-feira, 12 de outubro de 2020

METEORITO MUITO GRANDE CAIU ENTRE LAGOA VERMELHA E VACARIA (RS)

No início da madrugada do dia 1º de outubro, um meteorito pesando possivelmente sete a dez toneladas, caiu na região entre Lagoa Vermelha e Vacaria, provavelmente no município de Muitos Capões, no nordeste do Rio Grande do Sul.

Ele causou uma explosão tão grande antes de chegar ao solo que impediu de se ver as estrelas no momento em que ela ocorreu. Isso dificultou, num primeiro momento, definir o que se chama de elipse de dispersão dos seus fragmentos. Além disso, não havia dados sobre os ventos na região, e eles afetam bastante a trajetória dos fragmentos menores. Porém, dados coletados pela Rede Brasileira de Observadores de Meteoros permitirão que seja definida sua trajetória. Por enquanto, está sendo considerada elipse de dispersão a área mostrada na imagem de satélite abaixo (Vacaria é a cidade no centro e bem à direita). A provável trajetória dele está na imagem seguinte (ambas fornecidas pela citada rede).  


A busca pelo meteorito começou logo após sua queda, mas até dia 11 de outubro ainda não tínhamos nenhuma notícia de que alguém houvesse encontrado pelo menos um pequeno fragmento dele.

O grande clarão, que várias câmeras captaram, indica que era um  meteoro grande. Mas, há vários fatores que podem estar dificultando a descoberta.  Conheço bem a região Vacaria – Lagoa Vermelha e sei que são numerosas ali as áreas de lavoura, o que dificulta o acesso e a visualização de fragmentos. Além disso, informações que recebi – ainda não confirmadas – dão conta de que havia vento muito forte na hora da queda. Desse modo, o melhor é buscar fragmentos ao longo das estradas.  

  Procurar um meteorito ou mesmo pequenos fragmentos dele é muito importante porque esses corpos rochosos têm um grande valor científico e podem ter também um grande valor de mercado, pois há muita gente que os coleciona e compra. A importância científica advém do fato de eles serem material com a idade da formação do nosso sistema solar (4,6 bilhões de anos).  Assim, cada um que se coletar é um dado a mais no estudo do nosso planeta e dos demais que circundam o Sol.

    É importante que a busca seja iniciada tão logo esteja definida a elipse de dispersão, porque a grande maioria dos meteoritos se altera facilmente por ação do intemperismo (chuva e sol, por exemplo), passando a se assemelhar a uma rocha comum (a menos que caia num deserto).

    Para a ciência, o tamanho dos fragmentos coletados não importa muito, pois os pequenos e os grandes têm a mesma composição. Para colecionadores, sim, quanto maior ele for maior seu valor comercial e museológico. O meteorito de que falamos poderá ser encontrado em fragmentos de até talvez dezenas de quilos, mas deve-se começar procurando aqueles entre dez e oitenta gramas. À medida em que forem sendo encontrados, ficará mais fácil saber onde procurar os maiores.

    A imensa maioria dos meteoros se fragmenta de modo explosivo ao atingir camadas mais baixas da atmosfera. A pressão aerodinâmica sobre eles se torna tão intensa que se rompem,  caindo no solo em incontáveis pedaços (que só então passam a ser chamados de meteoritos). Há poucos casos de meteoros que chegaram até à superfície sem explodir, abrindo crateras no solo.

A Rede Brasileira de Observadores de Meteoros foi criada em 2014 por Carlos Augusto Di Pietro, que mora em São Paulo. Ela reúne 118 operadores, que monitoram 185 estações em 21 estados. Os operadores são as pessoas que instalam as estações e divulgam os dados coletados por sua(s) câmeras(s) de monitoramento ligada(s)a um computador. A rede usa a sigla Bramon (de Brazilian Meteor Observation Network), não tem fins lucrativos e fornece informações gratuitas para todo o Brasil e outros países.

Geralmente um operador da rede possui uma só câmera. Mas, alguns possuem até dez equipamentos desses, como Carlos Fernando Jung, de Taquara (RS), que possui doze dessas câmeras, cobrindo todo o céu.

A instalação de uma estação é simples e custa entre R$ 300,00 e R$ 1.000,00, informa Carlos Di Pietro. A Bramon conta com pessoal que orienta sobre como fazer isso. A estação pode ser instalada, inclusive por quem mora em apartamento.

Com os dados de duas dessas câmeras, desde que afastadas pelo menos 100 km uma da outra, já dá para traçar a trajetória do meteoro e definir o local de sua queda.

Quem quiser procurar fragmentos de um meteorito caído recentemente, deve buscar pedaços de rocha como os da foto abaixo. 




 Eles são escuros na superfície, com depressões (chamadas regmaglitos) semelhantes às que se formam quando se pressiona uma argila com os dedos. No interior, porém, costumam ser semelhantes a um pedaço de cimento. Deve-se procurar fragmentos pequenos, pois, embora sejam mais difíceis de serem visualizados, para cada fragmento de 500 gramas deve haver uns mil menores. 

O melhor lugar para procura, na elipse de dispersão, são as estradas. Se choveu depois da queda, olhar com cuidado as valetas por onde escorre a água da chuva.

Quem encontrar um fragmento de possível meteorito deve fotografá-lo e enviar a foto ao Museu Nacional, no Rio de Janeiro, onde trabalha astrônoma Maria Elizabeth Zucolotto, a maior especialista em meteoritos do Brasil. O Museu possui um dos poucos laboratórios do mundo capazes de identificar e atestar a autenticidade desse material. Se ela achar que pode ser de fato um meteorito, recomenda-se enviar um fragmento que deve ter pelo menos 30 gramas, já que 5  a 10 gramas são usados para análise e 20 gramas devem ficar depositados no Museu.

Os meteoritos recebem sempre o nome da localidade onde foram encontrados. Assim, talvez eu tenha em breve a satisfação de saber que foi encontrado o meteorito Lagoa Vermelha, nome da cidade em que eu nasci.