Nunca
acreditei que o material mostrado na foto e vendido como ouro, nessas
garrafinhas com um líquido incolor, fosse mesmo ouro. Este metal tem uma
densidade enorme e não flutuaria como se vê, no líquido do vidrinho.
Flutuar
não é bem o termo, porque ele não fica na superfície do líquido; quando agitado,
espalha-se nele e só aos poucos vai para o fundo.
O
líquido é, claro, pode não ser água, mas mesmo que seja uma substância de
densidade bem alta, como é o bromofórmio, acho difícil que o ouro não fique
sempre no fundo.
Em
janeiro, porém, vi esse material à venda na Smithsonian Institution, em
Washington, como ouro, por 8 dólares. Não só dizem que é ouro como dão
gratuitamente um cartãozinho descrevendo a história e usos do precioso metal.
A
Smithsonian é muito séria. Daí minha dúvida: será este ouro na verdade uma
liga, com ouro, sim, mas em pequena proporção? O líquido não é água, me
informaram lá.
Resolvi expor minha dúvida em vários grupos do Facebook
que reúnem colecionadores de minerais. Os comentários postados mostram que a
dúvida não é só minha, mas de muita gente.
Alessandra
Silva contou que já teve um vidrinho
assim, mas jogou fora, certamente por achar que não tinha valor. William
Campos disse: “Qualquer idiota sabe que não é ouro, mas não informou de
onde vem sua convicção.”
Sergio Klein foi mais
lúcido e ponderado na sua opinião: “acho que o líquido é glicerina, que é
viscosa, e assim os flocos levam mais tempo para se
deslocarem. Existem vidros com prata e
com cobre, do mesmo jeito. Viscosidade e densidade são coisas bem
diferentes, e as pessoas costumam confundir. Creio que o líquido viscoso seja
glicerina.”
Klein traz duas informações
importantes: o líquido talvez não seja muito denso, mas sim muito viscoso, o
que não me havia ocorrido. E conta que são vendidos vidrinhos também com cobre
ou prata, que eu nunca vi.
Meu amigo
gemólogo Rogério Viana Leite conta
que no
Museu de Gemas que havia no mezanino da Torre de TV em Brasília, onde ele
trabalhou, eram vendidos esses vidros com folhas de ouro. Eles inclusive forneciam
um certificado de autenticidade. Mas, conta que ele ainda possui dois vidros
desses e que em um deles as folhas oxidaram completamente e no outro houve oxidação
parcial. E ambos os vidros perderam os líquidos.
Isso
confirma minha suspeita de que se trata de uma liga de ouro, mas com
porcentagem muito baixa desse metal, daí a oxidação. E uma pessoa ligada aos distribuidores
disse ao Rogério que se trata, sim, de uma liga de ouro de baixa qualidade.
Rogério informa também que o líquido pode evaporar,
informação importante para quem adquire o produto.
Julio
Cesar Bortoluzzi também vende os potes com ouro, no seu museu A Mina, em Gramado
(RS). Eles dizem sempre aos clientes que se trata de metal com banho de ouro,
banho este que deve ser bem leve até pelo preço de venda dos potes. Julio Cesar
postou também que vai entrar em contato com o fabricante, que é de Minas Gerais,
para saber a natureza do líquido e para confirmar a qualidade do banho de ouro.
E informou que hoje a China produz muito esse produto.
Bortoluzzi chama atenção para o
fato de que banho de ouro é uma técnica muito barata. Um banho tipo flash ou eletroplate, diz ele,
levaria essas folhas a custar em torno de R$ 1,00. “Mesmo um banho com 5
milésimos de ouro, que é o banho de bijuterias baratas, seria em torno de R$
2,00 Então um pote desses com folhas banhadas a ouro é barato mesmo. Pode se
importar da China por menos de 1 dólar”,
escreveu ele.
Gabriel Gonçalves não duvida que as
folhas sejam banhadas, mas como o ouro é altamente maleável, “talvez a massa
total de ouro necessária para fazer as folhas dentro de um potinho seja tão
pequena que até valha a pena usar ouro mesmo”, diz ele. Gabriel calcula que um
potinho com folhas de 10 micrômetros de espessura e 5 cm² contém
aproximadamente 0,1 g de ouro. Como o grama deste metal custa hoje
aproximadamente R$ 150,00, cada pote custaria algo em torno de R$ 15,00, logo,
pode ser ouro mesmo e não apenas um banho. E acrescenta: “Não sei como isso é
fabricado, mas o fato de ele ‘flutuar’ na verdade tem mais a ver com a
resistência do fluido causada pela grande área da folha em relação a sua massa.
Da mesma forma que uma folha de papel demora mais para ‘afundar’ no ar do que
uma bola de boliche, a relação entre a massa da folha, sua área superficial, a
densidade e principalmente a viscosidade do líquido fazem com que ela afunde
mais devagar.”
Mauricio Fenilli lembra que “se o líquido for um óleo com
alto índice de refração, as folhas parecerão ainda maiores e mais espessas do que
realmente são”.
O geólogo José Eduardo Amaral conta que, no Japão, viu “vodca
de batata, também chamada de saquê de batata, com finíssimas folhas de ouro em
suspensão. E são folhas de ouro, sim. Quando em repouso, aos poucos vão para o
fundo da garrafa, lentamente. A relação
área/massa das folhas de ouro é favorável a isso. “ Confirma, pois, o que pensa
Gabriel Gonçalves. Alex Ribeiro conta que
leu sobre “uma cerveja belga, Golden Queen Bee, em que flocos de ouro flutuam
no interior. E indica um vídeo sobre isso: www.youtube.com/watch?v=f044levfMQw
“.
Outro comentário foi feito por Van Van e reforça as
explicações de Amaral e Gabriel Gonçalves. “El oro es tan maleable que puede
trabajarse mediantes golpes para dejar uma lámina tan fina que su espessor
llega a unas pocas micras. El oro cuando se encontra em tan finas láminas pude flotar em agua, aunque ele
liquido que acompanha al oro em estes frascos suele ser alcohol que evita que essas
delgadas láminas se pegoteen.”
O geólogo Rodrigo
Dal Olmo Sato também acredita que é ouro mesmo. “Tenho essas folhas de ouro,
são folhas de ouro utilizadas em restauros de esculturas e molduras douradas.
São compradas em lojas especializadas. É ouro, sim.”
Há, porém, quem acredite que não há
nada de ouro realmente. Katherine
De Paula acha que “provavelmente é alumínio pintado com tinta dourada
impermeável para não enferrujar” e Cleomar Piovesan tem certeza de que
são “pequenas lâminas de alumínio dourado com uma mistura de álcool e vaselina
vendida como lenda do ouro”.
Então, como ficamos?
Para mim trata-se de ouro, mas na
forma de liga ou talvez, revestimento. O
fato de poder oxidar-se completamente assegura que não é ouro puro.
Estaria a Smithsonian Institution,
neste caso, enganando os consumidores ?
Não. Todos nós falamos em anel de
ouro, brinco de ouro, pulseira de ouro, etc. mesmo sendo eles feitos com uma
liga que tem no máximo 75% de ouro.
Poderia ser mais transparente, isso sim, informando, em letras miúdas a
real natureza do material. Aliás, a Smithsonian deveria fazer isso também com
as cianitas que vende na loja do museu. Elas têm um brilho e cores muito
atraentes, mas que são frutos de um tratamento que as reveste com um óxido
metálico.
E com relação ao líquido? Pelos depoimentos de Sérgio Klein e Cleomar Piovesan, acredito que seja glicerina, talvez com álcool
também. Álcool apenas não deve ser, pois não tem a mobilidade que seria de se
esperar dessa substância.
Mas, continua aguardando notícias de
Julio Cesar Bortoluzzi, que vai pedir informações ao seu fornecedor.
O geólogo Miguel de Souza disse que examinou uma dessas lâminas em lupa binocular e que não era ouro. Aparentemente era outro metal, pintado de amarelo.
ResponderExcluirAo contrário de mim, que sempre duvidei que fosse ouro e agora admito que pode ser em alguns casos, meu amigo e colega de profissão Paulo Amorim dos Santos Lima sempre achou que era ouro e agora tem dúvidas.
ResponderExcluirEste blog chegou hoje à marca de 60.000 visualizações. Obrigado, gente !
ResponderExcluirJulio Cesar me informou, dia 3 de fevereiro, que fez contato com os fabricantes dos potinhos em Minas Gerais. Eles disseram que se trata de "um banho leve de ouro e um líquido especial" (palavras de Julio Cesar). Não informaram que líquido é nem deram mais detalhes sobre o ouro, provavelmente temendo que copiem o produto.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPuxa, eu me enganei Olhei de novo a embalagem da Smithsonian e ali está, com letras bem pequenas: 24 Karat gold. Então, eles vendem como ouro puro. E deve ser mesmo, eu acredito.
ResponderExcluirComo Katherine De Paula e Cleomar Piovesan, o geólogo Miguel Martins de Souza não acredita que seja ouro. Ele nos disse que abriu um potinho desses e "não era ouro coisa nenhuma".
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