quinta-feira, 24 de abril de 2014

A PETROBRÁS E EU


           Quando eu era estudante de Geologia, na segunda metade da década de 1960, nossa profissão era muito pouco conhecida. Ainda é, na verdade, mas bem menos que naquela época. Quando me perguntavam que curso eu estava fazendo e eu respondia Geologia, era muito comum o comentário Ah, e depois vai trabalhar na Petrobrás, né?

            Associar a profissão de geólogo com a Petrobrás não era pura desinformação. Nossos cursos de Geologia surgiram pela necessidade de fornecer este tipo de técnico àquela empresa, criada quatorze anos antes de eu ingressar na universidade.

            Nunca trabalhei na Petrobrás, mas, depois de diplomado, as confusões continuaram a acontecer: quando eu dizia que era geólogo (muitos entendiam zoólogo), vinha o comentário: Ah! Trabalha na Petrobrás?

Na verdade, o trabalho na grande empresa brasileira de petróleo nunca me atraiu muito, como não atraiu vários de meus colegas de turma. A Petrobrás oferecia ótimo plano de carreira, excelente programa de treinamento e uma remuneração atraente. Mas, ao lado dessas atrações, havia inconvenientes.

Obviamente, a gente iria trabalhar com pesquisa para petróleo, e isso a empresa só fazia nas áreas geologicamente mais promissoras, entre as quais não se incluía (como ainda não se inclui) o sul do Brasil. Além disso, era um trabalho muito especializado e numa empresa que detinha monopólio da pesquisa de petróleo no Brasil, de modo que quanto mais a gente se especializasse trabalhando na Petrobrás, mais restrito ficava o mercado para quem dela saísse.  Pelo menos era o que eu e vários dos meus colegas de turma pensávamos.

            Além, disso, havia outro fator, menos importante, mas presente: dizia-se - não sei se era verdade - que a Petrobrás não gostava de geólogos gaúchos porque eles não ficavam lá muito tempo. Depois de uns dois ou três anos, saíam.

            No ano em que me formei, a empresa procurou geólogos recém-formados para contratar e, apesar das restrições apontadas, fiz a prova de seleção que ela exigiu (não sei bem se era concurso). As ofertas de emprego eram escassas e eu não podia me dar o luxo de escolher muito.  Por coincidência ou não, ninguém da minha turma foi chamado e nunca fiquei sabendo do resultado da minha prova.

            Apesar de nunca ter exercido atividades profissionais na nossa empresa estatal de petróleo, ela sempre foi importante para mim. Como brasileiro e como geólogo, não havia como ignorar sua relevância em muitos aspectos, e tudo o que de importante com ela acontecia me interessava, como continua interessando.

Empresas petrolíferas ocupam lugar de destaque no mundo todo. A pesquisa e produção do petróleo são empreendimentos muito caros e envolvem, portanto, recursos muito grandes. Se o petróleo está no fundo do mar, o custo é bem mais elevado. E se for no pré-sal, a profundidades muito maiores, eles sobem ainda mais. Além disso, o risco de insucesso nesse tipo de pesquisa é também alto.

 Se, apesar disso, tanto se investe nesse setor, é porque o preço do produto compensa, e muito. Daí haver quem diga que o melhor negócio do mundo é uma empresa de petróleo bem administrada e o segundo melhor negócio do mundo, uma empresa de petróleo mal administrada.

A Petrobrás não foge à regra: opera com grandes recursos financeiros, investe muito em desenvolvimento tecnológico e paga elevados salários, exatamente como fazem as grandes empresas do setor com as quais é obrigada a competir, principalmente porque já não existe o monopólio estatal de pesquisa, produção e, na prática, também de refino que havia antes.

Numa empresa em que tudo é grande, não é de estranhar que ela tenha lugar de destaque na administração federal. Quando foi escolhido para presidir o país, durante o regime militar, o que fazia o general Ernesto Geisel? Era presidente da Petrobrás.  E o ex-presidente Lula a ela se referia, quando estava na presidência, como “aquela nação amiga”.

Cobiçando seu controle, os políticos sempre estiveram de olho nos seus importantes cargos de direção. Mas, até alguns anos atrás, parecia que a área técnica da empresa ficava sempre preservada, permitindo contínuo crescimento. Infelizmente, isso já não acontece, como tem mostrado a imprensa todos os dias.

Em um país onde a corrupção parece estar em todos os setores da administração pública, nossa petroleira, dona de um orçamento gigantesco como ela, se vê envolvida em corrupção e desvio de recursos públicos de igual magnitude.

Mas, o que se fez na compra da refinaria de Pasadena é demais até para o gigantismo de uma Petrobrás. Metade de uma refinaria nos EUA que havia sido adquirida por US$ 42,5 milhões foi comprada por ela, pouco depois, em 2006, por US$ 360 milhões!  O que já seria um absurdo total dobrou de tamanho: a Petrobrás, por força contratual, foi obrigada a comprar a outra metade da refinaria, tentou fugir dessa cláusula do contrato, não conseguiu e acabou pagando mais de US$ 1 bilhão por algo que valia US$ 42,5 milhões (ou pouco mais, considerando investimentos que haviam sido feitos antes da compra).

Não importa que a oposição queira explorar esse assunto na campanha presidencial desse ano – ela certamente o fará. É preciso que isso seja muito bem esclarecido e que os responsáveis sejam claramente indicados. E não há como tirar a presidente da República disso. Ela conhece muito bem o setor energético. Foi secretária de Minas e Energia do Rio Grande do Sul, em dois governos. Foi ministra de Minas e Energia de Lula. Era presidente do Conselho de Administração da Petrobrás na época da compra. Foi a todo-poderosa chefe da Casa Civil da Presidência da República. E é há quatro anos presidente deste país. Não há como dizer que “não sabia”. E, mesmo que não soubesse, teve tempo de sobra para tomar providências. Por que não o fez?

A compra da refinaria de Pasadena é um escândalo monumental.  Mas, o pior é que não é o único problema sério da Petrobrás nos dias atuais.  Em 2010, a dívida da empresa era de 62 bilhões de reais; terminou 2013 com 221,6 bilhões (aumento de 257%).

            A autossuficiência na produção de petróleo, anunciada por Lula, foi uma nuvem muito passageira: a produção está estagnada, e o Brasil importa derivados de petróleo, vendendo a gasolina aqui por preço inferior ao pago lá fora.

            O congelamento do preço da gasolina ajudou muito a aumentar a dívida da Petrobrás mencionada acima e o lucro por ação da empresa, juntamente como seu valor de mercado, caíram 50% na gestão Dilma Rousseff.

            A Petrobrás é tão grande que talvez em pouco tempo recupere o prestígio e o valor que tinha alguns anos atrás. Mas não será com esta administração federal que aí está que isso vai acontecer. São necessárias mudanças, grandes mudanças.

 

 

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