Quando foi aberta
a Av. Loureiro da Silva, em Alegre, na década de 70 do século passado, na
confluência dela com a Rua Avaí ficou sobrando um pequeno terreno em forma de
triângulo, medindo cerca de 60 m x 80 m, que foi transformado em praça.
Não era das
praças mais bem cuidadas da cidade e muitas vezes tive que pedir, em nome da
Associação dos Amigos da 24 de Maio e Adjacências (Amivi) que fizessem limpeza,
poda, corte de grama, etc.
Certo dia, em 2004,
caminhando por ali, me dei conta de que a praça não tinha nome! Por incrível que pareça, não havia nenhuma
placa com nome do logradouro nem eu vira ou ouvira uma vez sequer seu nome. E
resolvi sugerir uma denominação para aquele logradouro.
Os caminhos
entre os mal cuidados canteiros da pracinha haviam sido revestidos com saibro e
nele havia abundantes cristais de muscovita, uma das micas mais comuns. À noite, essas pequenas palhetas do mineral
refletiam a luz dos postes e tornavam cintilante o chão do local. Inspirado
nisso, escrevi a um vereador conhecido propondo que se desse àquele local o
nome de Praça Chão de Estrelas. Assim fazendo, o legislativo porto-alegrense
estaria homenageando um dos grandes compositores brasileiros (Orestes Barbosa),
uma composição que é um clássico da música popular brasileira (Chão de Estrelas) e, indiretamente, homenageando
também a Geologia, através das modestas palhetas de muscovita que no seu chão
cintilavam.
Eu tinha consciência de que minha sugestão
era exótica, pois nesta leal e valorosa Porto Alegre ruas, praças, avenidas,
etc., recebem sempre nome de pessoas famosas. Há muito se foi o tempo em que
recebiam nomes como Rua da Praia, Rua do Parque ou Rua Saudável. Mas, quixotescamente
encaminhei a sugestão.
Minha correspondência não mereceu resposta,
porém pouco tempo depois instalaram na praça uma placa com os dizeres Pç. Salvador Allende – Herói das Américas.
Tudo bem, eu não acreditava mesmo que minha sugestão fosse aceita e Allende tem
lá seus méritos, ainda que seja apenas a fidelidade aos seus ideais, que
demonstrou ter à morte. O nome da praça, descobri recentemente, foi dado por
lei municipal de 8 de setembro de 2004.
Continuou a praça, agora com nome, no
mesmo semiabandono de sempre até novembro de 2012, quando começou a passar por completa
reforma, contrapartida de um projeto que prevê a construção junto a ela, em
2013, de um hotel de dezoito andares, com lojas comerciais e garagens. Só que as obras começaram mal.
Um anúncio do empreendimento com
fotomontagem, publicado na revista Veja,
edição de 12 de dezembro, pareceu-me propaganda enganosa, além de conter erros
técnicos. Enviei-o ao Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação
Publicitária) e o conselho, concordando comigo, abriu um processo ético contra
a empresa responsável.
Mas, o mais triste foi que, no dia 8 de
novembro, derrubaram a maior árvore que havia na praça (foto abaixo). Ela
tinha, eu reconheço, raízes ousadas e atrevidas, que se espalhavam em todas as
direções. Mas, assim era havia muitos anos e nunca se ouvira qualquer reclamação.
Elas só se tornaram problema quando decidiram construir um hotel ali perto... Raízes
igualmente atrevidas e ousadas existem, por exemplo, na Pç. Raul Pilla, a 200 m
dali, com o agravante de já haverem detonado a calçada, e, no entanto nada foi feito
até hoje.
A derrubada da árvore revoltou
moradores, houve gente chorando, a presidente da Amivi pediu explicações à Smam
(Secretaria Municipal do Meio Ambiente) e o que conseguiu foi uma resposta
arrogante da funcionária que a atendeu.
Mas se a derrubada da árvore se
justificava, inaceitável foi a atitude de extrema arrogância e insensibilidade
de instalarem um plantão de vendas do empreendimento imobiliário exatamente ao
lado do que dela restou, a base do tronco, que ali ficou por uns dias (foto
abaixo). Foi puro deboche !
Mas, nada mais havia a fazer. A Praça
Salvador Allende, como eu disse, passou por uma completa reforma. Ganhou nova iluminação,
bancos e lixeiras também novos, algumas árvores, etc. Só que... cobriram o saibro onde a
mica cintilava com uma espessa e insensível camada de concreto. Todo o espaço
entre os canteiros é agora puro concreto. Clarinho, uniforme, seguro para se
caminhar, mas não mais com cristais de mica, não mais com a muscovita que permitia a qualquer pessoa "pisar os astros distraída" e que antes
"salpicava de estrelas nosso chão".
Em agosto, foi derrubado um grande jacarandá que, em outubro, ficava esplendorosamente florido. Com ele, caíram mais sete árvores.
ResponderExcluirAs nove árvores derrubadas para construção do hotel deverão ser substituídas por outras 44. Vamos ficar de olho e cobrar essa compromisso.